O Livro II da República de Platão inicia com Glauco classificando três espécies de bens: (1) os que buscamos sem desejar as suas consequências, mas apenas a satisfação de si mesmos, como as alegrias e os prazeres inofensivos; (2) os prazeres que buscamos por si mesmos e por suas consequências, como a visão, a saúde e o bom senso; (3) e os bens que não os buscamos por eles mesmos, mas pelas vantagens que proporcionam, como, por exemplo, a ginástica, a cura de uma doença, o exercício da arte médica ou de outra profissão lucrativa (exemplos do Platão). Em seguida, Glauco questiona Sócrates em qual dessas três espécies de bens ele colocaria a justiça. Sócrates crê ser a justiça pertencente à espécie (2) mais bela para se alcançar a felicidade: à espécie onde buscamos os bens por si mesmos e por suas consequências. Já Glauco diz que a opinião da maioria das pessoas é que a justiça pertença à espécie (3) dos bens penosos que apenas são cultivados pelas recompensas que trazem.
Em vista disto, Glauco pede para Sócrates realizar um elogio à justiça, considerando-a como um bem em si mesmo sem considerar as consequências boas que ela proporciona (1); Glauco provoca Sócrates elaborando uma estratégia que visa apresentar o que comumente se entende por justiça e sua origem; depois procura demonstrar que quem pratica a justiça não a pratica por considerá-la um bem, mas por que certa necessidade o obriga a fazê-lo – uma vez que a vida do homem injusto é superior à do homem justo; em suma, Glauco se aplica em elogiar a injustiça na esperança que a partir de tal elogio Sócrates empreenda uma censura à injustiça e um elogio à justiça. Vamos ao discurso:
Tudo se passa, segundo Glauco, como se uns procurassem prevalecer sobre os outros, sendo este o bem individual naturalmente procurado por todos. Neste sentido, cometer a injustiça é bom e sofrê-la é mau; mas é pior o mal por sofrê-la do que o bem por cometê-la. Se uma pessoa pudesse causar injustiça sem sofrê-la, jamais se absteria de fazê-la. Mas se alguns fossem impedidos de causarem injustiças, ou se, ao mesmo tempo, a causassem e a sofressem, procurariam, então, entenderem-se a partir de leis e convenções que reduziriam o bem individual ao respeito da igualdade, de tal forma que a força e as leis garantiriam o que é justo por acordo mútuo. A justiça é apreciada, desta maneira, não como um bem em si mesmo, mas como uma solução viável quando alguém se torna impotente para causar a injustiça ou se prevenir de sofrê-la. Basta prover o justo e o injusto de um poder total para fazerem o que quiserem que logo se perceberá ambos buscando os mesmo objetivos já prescritos em sua natureza: prevalecer sobre todos os demais o máximo que se puder. Só um homem que não tivesse tal possibilidade é que desejaria, contra sua vontade própria, afiliar-se ao pacto da justiça.
Percebe-se, no entendimento de Glauco, que ao confrontar a vida do justo com à do injusto, este terá uma vida bem melhor que aquele. Glauco pede que se conceda ao injusto a mais perfeita injustiça e a mais perfeita aparência de justiça, enquanto ao justo se conceda o contrário: a mais perfeita justiça com a mais perfeita aparência de injustiça. O resultado é claro: ao homem injusto com aparência de justo, glórias; ao homem justo com aparência de injusto, crucificação.
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PLATÃO. A República de Platão; tradução de Enrico Corvisieri. Nova Cultural, São Paulo: 1999.
Texto muito bom! Pega os pontos legais desse livro!
ResponderExcluirObrigado pela visita e comentário. Abraços!
Excluirmuito bom valeu
ResponderExcluirQue bom que contribuiu. Obrigado!
ExcluirExcelente
ResponderExcluirPoderia me responder qual mensagem o livro quer passar, qual o seu princípio ?
ResponderExcluirOlá, Nickole.
ExcluirFaz tempo que li A República de Platão. Parece-me, pelo que lembro, que o livro II está inserido numa progressão argumentativa, que partiu do tema sobre a Justiça (livro I). Há a questão de se saber o que é a justiça, qual a sua origem e qual a sua finalidade. A resposta a essa pergunta somente ocorrerá no livro IV. Sendo assim, a mensagem que o livro II da República parece passar é a da construção ideal da cidade perfeita, para que se possa verificar, em seguida (livro IV), o que é a Justiça dentro da cidade e se o homem justo é mais feliz que o homem injusto.
Espero ter compreendido a sua questão e ter te incentivado, de algum modo, a ler o livro e chegar na sua conclusão.
Estou à disposição.
Obrigado pelo comentário, me ajudou muito em meu trabalho.
Excluirpoderia me proporcionar perguntas sobre o livro || com suas devidas respostas? pra hoje! por favor.
ResponderExcluirOlá, Andressa. Não tenho perguntas prontas. Também não me lembro bem sobre os detalhes do livro, pois faz tempo que o li. Grande abraço.
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