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A VULGARIZAÇÃO FILOSÓFICA NO ENSINO MÉDIO

Pode-se dizer, com a total licença histórica, que muitos problemas foram degustados, meditados, discursados ou criticados, com a sutil e firme excelência daqueles que se engajaram nessas atividades: os Filósofos. Nem sempre esses pensadores se restringiram aos confinamentos de um recinto iluminado à luz de velas, ao modelo de um homem debruçado em meio aos livros, à poeira e à solidão. Muitos filósofos também desceram à praça pública, comprometidos em conduzir o povo aos limites de sua realidade social, política, existencial, etc. Foi o caso, apenas para citar dois exemplos, de Sócrates (470-399 a.C) e Sartre (1905-1980). O primeiro, após insuflar a juventude a uma racionalidade diferente daquela que os políticos promulgavam em sua época, provocou enorme desconforto aos homens públicos, acusando-os de deformar o saber em busca de proveitos próprios e de causar alienação e confusão entre os moradores atenienses. O segundo transcreveu seus conceitos filosóficos para uma literatura engajada aos temas mais profundos e esclarecedores sobre a existência humana: liberdade, responsabilidade, autenticidade, entre outros; o sentimento de viver a invasão nazista nos territórios franceses proporcionou a Sartre se auto-representar como um herói intelectual, erguendo-se contra aquela ocupação e provocando os franceses a expulsar “as moscas” que infestavam suas realidades. Dessa forma, uma das características que aproximariam esses dois pensadores seria o compromisso do diálogo com àqueles ignorantes aos processos pelos quais se tornam passivos e manipulados pelo sistema vigente.

Ao se analisar parte da realidade educacional pública brasileira, mais precisamente, o desenvolvimento das atividades filosóficas em diversas salas de aulas do ensino médio, verifica-se que, com a obrigatoriedade do ensino dessa disciplina, muitos iniciados e portadores dos assuntos filosóficos (os professores de Filosofia) têm a missão de levá-los aos jovens estudantes, repetindo o que esses e outros grandes mestres do pensamento realizaram no passado. O filósofo Sartre, em seu livro O Existencialismo é um Humanismo, definiu a filosofia existencialista como uma doutrina da ação e do compromisso, devendo-se vivê-la sinceramente e comprometendo-se em levá-la até o fim, não se restringindo a impô-la somente pelos livros. Nesse sentido, o filósofo apontou que as aulas dessa disciplina deveriam acontecer sob certa “dosagem” de vulgarização do seu conteúdo, proporcionando uma transmissão desses conhecimentos aos alunos que se iniciam; entretanto, acrescentou que esse “empobrecimento” não deveria deformar a Filosofia. Assim, uma questão, dentre inúmeras possíveis, impõe-se aos diversos professores envolvidos: quais os limites da vulgarização filosófica na sala de aula para que a Filosofia não seja deformada?

Proponho apenas uma abordagem inicial sobre o assunto. Dessa forma, uma reconstrução temática com exemplos onde os alunos reconheçam sua própria realidade, inserindo situações que os façam compreender o significado de alguns termos empregados pela tradição; a realização de uma “passagem interna” entre Filosofia e Literatura, e entre Filosofia e outras disciplinas ofertadas ou não pelo Estado; o acesso a recursos visuais e auditivos que ilustrem o cotidiano, proporcionando a leitura de suas conexões (ou desconexões) internas seriam exemplos de modelos utilizados pelo professor de Filosofia durante o transporte dos difíceis contextos filosóficos para a tarefa de interpretação da realidade e de suas desejáveis reformas.

Com isso, além de transmitir a herança de um vocabulário fértil de reflexões e mostrar
como os filósofos conceituaram as realidades de suas épocas, os professores proporcionariam aos alunos a compreensão dos diversos valores e ideologias que os enredam neste começo de milênio, tornando-os pessoas e cidadãos na auto-construção de nossa realidade – uma das condições legais para que a Filosofia seja ofertada pela Federação brasileira. Uma das maiores exigências seria a conciliação das expectativas dessa Federação com àquilo que os clássicos textos poderiam sugerir, bem como o processo de emancipação intelectual do aluno através de uma linguagem acessível a um povo que sofre, sobretudo, da escassez de Educação. Apesar das inúmeras dificuldades encontradas, os professores comprometidos criariam recursos para esse engajamento que somente eles poderiam hastear nesse momento histórico. Assim, a vulgarização filosófica seria mais um critério metodológico disponível ao ensino da Filosofia.

Comentários

  1. Concordo Tiago, isso se aplica tambem a sociologia... Pois é preciso trazer a realidade para as pessoas de forma que isso possa trazer uma relevancia e um siginifcado para eles alias para todos nós, pois até o momento os problemas, as realidades, as dificuldades ficam muito abstratas dificultando assim a compreenssão daquele que ainda não se iniciou ou está se inciando tanto na filosofia como na sociologia.... abraços

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  2. Aplique a contextualidade do seu excerto para a promessa do Governo dentro das diretrizes da Educação Ambiental no Brasil e verá o mesmo cenário se repetindo em ciclos infinitos de geração a geração desde a primeira Conferência de Tblisi, Geórgia. Frustrante até pra mim, que passei no concurso da Secretária do Meio Ambiente paulista e talvez enfrente esse dilema cotidiano no meu futuro profissional. Foda!

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  3. Grande alter-ego do Matheus,

    Obrigado pela participação;
    Parabéns pela aprovação no concurso e pelo "fardo" (ou não) da vulgarização em seu futuro.

    Que essa frutração não domine você!
    Grande abraço.

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