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Filosofia “ao pé da letra”: o texto filosófico na EJA

Sabe-se que a EJA (Educação de Jovens e Adultos) foi instituída com a finalidade, dentre outras, de promover o desenvolvimento da autonomia intelectual do estudante privado dos estudos em alguma etapa da sua vida. As diretrizes que norteiam os trabalhos com essa modalidade almejam a emancipação humana através do exercício de uma cidadania democrática. Através de seus eixos temáticos, a disciplina de Filosofia pode oferecer, no contexto da EJA, importantes reflexões sobre “o como” e sobre “o quê” os filósofos pensaram e discutiram racionalmente no decurso da história, aproximando os estudantes aos temas que eles já vivenciam silenciosamente.

Convencido de que tal experiência deve ser lenta para ser eficaz, e concentrada para ser permanente, o texto filosófico – ou aquele que versa sobre filosofia – se mostra, sobretudo, como o “solo” firme e duradouro no qual a experiência filosófica se dá e se repete, auxiliando o estudante a confrontar inúmeras dificuldades herdadas de uma história segregadora.

Pensando em combater tais dificuldades, trabalhou-se o texto filosófico na expectativa de se compreender a receptividade dos alunos e quais os níveis de comprometimento e de reflexão decorridos dessa experiência. Alguns conceitos básicos da Filosofia foram reconstruídos, garantindo condições necessárias para a inserção do texto filosófico. Iniciou-se, em 2011, a primeira meditação e o começo da segunda, do filósofo René Descartes, o texto Sobre a verdade e a mentira no sentido extra-moral, do filósofo Nietzsche, e o texto de Jean-Paul Sartre, O existencialismo é um humanismo – todos disponibilizados pelo Governo do Paraná, através do livro intitulado Antologia de textos filosóficos.

Leu-se cada parágrafo, utilizando-se dicionários e exposições para que o entendimento se fizesse concomitante à leitura. A dificuldade observada nessa experiência se resumiu ao distanciamento do aluno em relação à linguagem dos textos, causando sérios desestímulos que quase comprometeram o trabalho. O ano de 2012 apresentou uma novidade: o livro didático de Filosofia (da autora Marilena Chauí), trazendo consigo a promessa de uma linguagem menos rebuscada e uma maior eficácia na relação entre os filósofos e o dia a dia do estudante. Os estudantes compreenderam alguns conceitos básicos e em seguida iniciaram a produção de um texto próprio, onde explicaram o texto da Guiomar de Grammon, Ler devia ser proibido, utilizando-se dos conceitos filosóficos trabalhados no livro didático. Essa experiência diagnosticou algumas dificuldades: a interpretação e a produção de texto a partir dos conceitos filosóficos; e o distanciamento/lentidão que a leitura filosófica representa em relação às exigências no cotidiano do estudante.

A experiência da leitura, discussão e construção de conhecimento a partir de textos filosóficos tem proporcionado, entretanto, inúmeros benefícios para alunos da EJA na cidade de Londrina/PR. Desde o primeiro contato com um léxico variado e técnico até o reconhecimento da necessária paciência para a construção do conceito, a experiência com a leitura filosófica mostrou que os alunos dessa modalidade podem ser inseridos no crescente número de cidadãos que passam a respeitar e a valorizar o trabalho milenar dos filósofos e, consequentemente, cumprir as demandas e objetivos propostos pelas Diretrizes Curriculares da Educação de Jovens e Adultos. O caminho mais adequado para que esse trabalho seja concretizado é a escolha correta dos temas e do tipo de texto que será trabalhado, para que o estudante se sinta parte do processo. 
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  • Resumo selecionado e apresentação no XV Encontro Nacional da ANPOF, realizado em outubro de 2012

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